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Quem sabe um dia...
sexta-feira, 23 de outubro de 2015
segunda-feira, 12 de outubro de 2015
OS FALSOS NOMES DA ILHA ANCHIETA
O costume moderno de "copiar e colar" levou à graves erros quanto aos antigos nomes da Ilha Anchieta, que de tanto serem automaticamente repetidos, estão se tornando falsas "verdades".
Encontramos na literatura diversos nomes atribuídos à Ilha Anchieta através dos tempos: Ilha dos Porcos (OVIEDO,1510; ALBERNAZ,1631), Tapera de Cunhambebe (SÃO PAULO, 1921; GUILLAUMON, 1989), Tapíra (SAINT-ADOLPHE, 1845; GUILLAUMON, 1989), Pó-Quâ (ALMEIDA, 1902) e Ilha Anchieta (Decreto de 17 de março de 1934).
No entanto é nosso dever alertar que algumas dessas denominações historiográficas referentes à Ilha Anchieta devem ser descartadas e rejeitadas, pois embora amplamente divulgadas e replicadas por diversos autores sem o devido cuidado de checagem das fontes originais, ou referem-se à outra localidade geográfica, ou são fantasiosas.
Convém antes explicarmos terem existido duas localidades homônimas denominadas “Ubatuba” (Ubativa, Uwattibi, Humbatiba) entre o litoral de Bertioga e o do Rio de Janeiro. Esta duplicidade causa ainda hoje enganos e contradições recorrentes em diversos textos sobre essa região.
Quanto aos falsos nomes da Ilha Anchieta, o primeiro deles, e o mais erroneamente replicado é a denominação Tapera de Cunhambebe. Esse nome refere-se à atual Ilha Cunhambebe localizada em Angra dos Reis, próxima à Ilha da Gipóia, no Estado do Rio de Janeiro.
A confusão vem de um documento datado de dezembro de 1610, onde encontramos o registro de uma sesmaria em Angra dos Reis. O documento cita que o peticionário não tendo terras para fazer mantimentos:
“[...] pedia lhe desse uma ilha que está defronte Ubativa chamada Tapera de Cunhambebe que terá de terra toda ella obra de meia legua pouco mais ou menos para nella fazer mantimentos ..................... ilha e terra está em Angra dos Reis e ilha de Jepo..ya e assim mais avante da dita ilha na ponta de terra firme [...]” (SÃO PAULO, 1921)
Também o nome Pó-Quâ, significando “pontuda”, foi uma tentativa do Dr. João Mendes de Almeida (1902) que procurou “adivinhar” a origem do nome original da ilha, Porcos, como sendo a possível corrugação dos vocábulos tupis pó e quâ. Basta uma breve leitura do prefácio de seu Diccionario Geographico para descobrirmos que o autor forçou a procura “de uma origem observavel e verificavel, quer na geographia da localidade, quer nos elementos da estructura grammatical do vocabulo tupi” (ALMEIDA, 1902). E também que:
Elle teve em vista as regras do methodo experimental, entre as quaes há uma que previne o observador quanto o espírito de systema; mas isto não quer dizer que deixe de ser observada a razão da existencia e a forma primitiva dos nomes portuguezes. Quasi todos os nomes portuguezes, dados não officialmente aos logares, observada a sua razão de existência e a sua forma primitiva, foram nomes tupis hoje alterados por corrupção em consequência ou da dificuldade da pronuncia da palavra tupi, ou da semelhança com a palavra portugueza no som, no ruído ou na ressonancia (ALMEIDA, 1902).
Nesse caso, o nome original e mais antigo registrado da Ilha Anchieta é ibérico, Puercos, portanto a tese fantasiosa de Almeida (1902) que o nome Porcos, seria uma corrupção do tupi Pó-Quâ, cai por terra.
Recorrendo portanto à fontes mais confiáveis e antigas, encontramos em Oviedo (Islario general de 1539-1600) comentando Alonso de Santa-Cruz, a justificativa do nome Isla de los Puercos, já bem difundido entre os navegadores europeus entre os séculos 16 e 17, “por nela haverem muitos porcos selvagens” .
Também encontramos o relato de uma professora primária, que viveu na Ilha Anchieta entre 1945 e 1948, onde é feita uma referência curiosa ao motivo da denominação Ilha dos Porcos:
Quando menina, estudava geografia de São Paulo e a Ilha dos Porcos me chamou a atenção, por causa do nome estranho. Mal sabia eu, que anos e anos se passariam e o meu primeiro emprego como professora seria justamente na antiga Ilha dos Porcos, hoje denominada Ilha Anchieta. Porcos! Por que se chamava assim essa famosa Ilha? Porque havia porcos catetos em grande quantidade vivendo nela. Não porcos domésticos, mas catetos, porcos selvagens, magníficos e perigosos. O cateto é chamado porco-do-mato brasileiro, mas não é da família do porco, porque só tem três dedos nas patas de trás. O que caracteriza esse animal é o colar de grossos pelos brancos, que rodeia seu pescoço. Em 1947 o último cateto da Ilha Anchieta foi abatido e eu tive o privilégio de comer um pedacinho de sua saborosa carne (DAS NEVES, 2012).
Também é notório nos relatos dos antigos navegadores a necessidade de constante reabastecimento das embarcações com víveres, principalmente água e alimentos. Por esse motivo muitas ilhas foram estrategicamente assinaladas com o nome “dos Porcos” nas primitivas cartas náuticas, diários de bordo e nos Roteiros ou Livros de Rotear, como locais propícios escolhidos para essa finalidade específica. Fato é, o nome Ilha dos Porcos ser recorrente em várias rotas costeiras do litoral brasileiro e americano, somente no território de Ubatuba são duas as ilhas com esta denominação, sendo uma a Grande (hoje Anchieta) e outra a Pequena (na Enseada do Ubatumirim).
E por último, Tapíra, registrado por Saint-Adolphe em 1845, nome que provavelmente seja o único que possa ter alguma ligação com uma denominação Tupi, embora o autor não revele as fontes consultadas impossibilitando uma checagem mais aprofundada.
Esperamos com esse breve estudo, contribuir para o fim dos recorrentes erros de denominação historiográfica da Ilha Anchieta, cegamente repetidos sem a devida checagem histórica, à ponto da fantasia se transformar em ralidade pela repetição mecânica de um engano grosseiro.
ESTE ESTUDO É UM TRECHO DA DISSERTAÇÃO DE MESTRADO DEFENDIDA EM SETEMBRO DE 2016.
Encontramos na literatura diversos nomes atribuídos à Ilha Anchieta através dos tempos: Ilha dos Porcos (OVIEDO,1510; ALBERNAZ,1631), Tapera de Cunhambebe (SÃO PAULO, 1921; GUILLAUMON, 1989), Tapíra (SAINT-ADOLPHE, 1845; GUILLAUMON, 1989), Pó-Quâ (ALMEIDA, 1902) e Ilha Anchieta (Decreto de 17 de março de 1934).
No entanto é nosso dever alertar que algumas dessas denominações historiográficas referentes à Ilha Anchieta devem ser descartadas e rejeitadas, pois embora amplamente divulgadas e replicadas por diversos autores sem o devido cuidado de checagem das fontes originais, ou referem-se à outra localidade geográfica, ou são fantasiosas.
Convém antes explicarmos terem existido duas localidades homônimas denominadas “Ubatuba” (Ubativa, Uwattibi, Humbatiba) entre o litoral de Bertioga e o do Rio de Janeiro. Esta duplicidade causa ainda hoje enganos e contradições recorrentes em diversos textos sobre essa região.
Quanto aos falsos nomes da Ilha Anchieta, o primeiro deles, e o mais erroneamente replicado é a denominação Tapera de Cunhambebe. Esse nome refere-se à atual Ilha Cunhambebe localizada em Angra dos Reis, próxima à Ilha da Gipóia, no Estado do Rio de Janeiro.
A confusão vem de um documento datado de dezembro de 1610, onde encontramos o registro de uma sesmaria em Angra dos Reis. O documento cita que o peticionário não tendo terras para fazer mantimentos:
“[...] pedia lhe desse uma ilha que está defronte Ubativa chamada Tapera de Cunhambebe que terá de terra toda ella obra de meia legua pouco mais ou menos para nella fazer mantimentos ..................... ilha e terra está em Angra dos Reis e ilha de Jepo..ya e assim mais avante da dita ilha na ponta de terra firme [...]” (SÃO PAULO, 1921)
Elle teve em vista as regras do methodo experimental, entre as quaes há uma que previne o observador quanto o espírito de systema; mas isto não quer dizer que deixe de ser observada a razão da existencia e a forma primitiva dos nomes portuguezes. Quasi todos os nomes portuguezes, dados não officialmente aos logares, observada a sua razão de existência e a sua forma primitiva, foram nomes tupis hoje alterados por corrupção em consequência ou da dificuldade da pronuncia da palavra tupi, ou da semelhança com a palavra portugueza no som, no ruído ou na ressonancia (ALMEIDA, 1902).
Nesse caso, o nome original e mais antigo registrado da Ilha Anchieta é ibérico, Puercos, portanto a tese fantasiosa de Almeida (1902) que o nome Porcos, seria uma corrupção do tupi Pó-Quâ, cai por terra.
Recorrendo portanto à fontes mais confiáveis e antigas, encontramos em Oviedo (Islario general de 1539-1600) comentando Alonso de Santa-Cruz, a justificativa do nome Isla de los Puercos, já bem difundido entre os navegadores europeus entre os séculos 16 e 17, “por nela haverem muitos porcos selvagens” .
Também encontramos o relato de uma professora primária, que viveu na Ilha Anchieta entre 1945 e 1948, onde é feita uma referência curiosa ao motivo da denominação Ilha dos Porcos:
Quando menina, estudava geografia de São Paulo e a Ilha dos Porcos me chamou a atenção, por causa do nome estranho. Mal sabia eu, que anos e anos se passariam e o meu primeiro emprego como professora seria justamente na antiga Ilha dos Porcos, hoje denominada Ilha Anchieta. Porcos! Por que se chamava assim essa famosa Ilha? Porque havia porcos catetos em grande quantidade vivendo nela. Não porcos domésticos, mas catetos, porcos selvagens, magníficos e perigosos. O cateto é chamado porco-do-mato brasileiro, mas não é da família do porco, porque só tem três dedos nas patas de trás. O que caracteriza esse animal é o colar de grossos pelos brancos, que rodeia seu pescoço. Em 1947 o último cateto da Ilha Anchieta foi abatido e eu tive o privilégio de comer um pedacinho de sua saborosa carne (DAS NEVES, 2012).
Também é notório nos relatos dos antigos navegadores a necessidade de constante reabastecimento das embarcações com víveres, principalmente água e alimentos. Por esse motivo muitas ilhas foram estrategicamente assinaladas com o nome “dos Porcos” nas primitivas cartas náuticas, diários de bordo e nos Roteiros ou Livros de Rotear, como locais propícios escolhidos para essa finalidade específica. Fato é, o nome Ilha dos Porcos ser recorrente em várias rotas costeiras do litoral brasileiro e americano, somente no território de Ubatuba são duas as ilhas com esta denominação, sendo uma a Grande (hoje Anchieta) e outra a Pequena (na Enseada do Ubatumirim).
E por último, Tapíra, registrado por Saint-Adolphe em 1845, nome que provavelmente seja o único que possa ter alguma ligação com uma denominação Tupi, embora o autor não revele as fontes consultadas impossibilitando uma checagem mais aprofundada.
Esperamos com esse breve estudo, contribuir para o fim dos recorrentes erros de denominação historiográfica da Ilha Anchieta, cegamente repetidos sem a devida checagem histórica, à ponto da fantasia se transformar em ralidade pela repetição mecânica de um engano grosseiro.
ESTE ESTUDO É UM TRECHO DA DISSERTAÇÃO DE MESTRADO DEFENDIDA EM SETEMBRO DE 2016.
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