quinta-feira, 5 de março de 2015

O “naturalmente real” e o “culturalmente imaginado”.

The perception of the environment: essays in livelihood, dwelling and skill ou A percepção do ambiente natural: ensaios em meio de vida/subsistência, habitação e habilidades práticas – Tim Ingold.
Resumo Peter Santos Németh
Devido à complexidade das ideias contidas nesses ensaios de Ingold, será dada atenção apenas ao texto introdutório que consegue em linhas gerais oferecer uma panorâmica do pensamento do autor sobre o que é o biológico e o que é o cultural nos seres humanos em sua relação com o ambiente natural.
Nesse trabalho Tim Ingold oferece uma persuasiva nova abordagem para a compreensão de como os seres humanos percebem seu ambiente circundante. Ele argumenta que aquilo que nós costumamos chamar de variação cultural consiste, em primeiro lugar, de variações da habilidade prática. Nem inatas, nem adquiridas, as habilidades práticas são “cultivadas”, incorporadas ao organismo humano através do treino e da prática associados à um ambiente. Habilidades práticas são portanto, tanto biológicas quanto culturais.
Para explicar como são geradas as habilidades práticas, o autor propõe antes entender as dinâmicas de desenvolvimento, que por sua vez, clamam por uma abordagem ecológica que situa os praticantes num contexto de engajamento ativo com os componentes constituintes do seu ambiente circundante.   
 Os vinte e três ensaios que compreendem esse livro focam em iniciar a busca por meios de subsistência nos quais o significado de “habitar” e a natureza da habilidade prática entrelacem as abordagens da antropologia social, da psicologia ecológica, da biologia desenvolvimentista e da fenomenologia, de um modo jamais experimentado antes.
O livro é posto para revolucionar o modo como pensamos o que é “biológico” e “cultural”, nos humanos; sobre evolução e história; e certamente sobre o que significa para os seres humanos (ao mesmo tempo organismos e pessoas), “habitar” um espaço natural. The perception of the environment será uma leitura essencial não só para antropologistas mas também para biólogos, psicólogos, arqueólogos, geógrafos e filósofos.
Na Parte I, “Meio de Vida/Subsistência” (Livelihhod), o autor foca nos modos como os seres humanos se relacionam com os componentes do espaço natural durante as atividades que proporcionam a subsistência. Ingold baseou-se particularmente em estudos etnográficos de povos cujo meio de vida é essencialmente construído pela caça e coleta. Na literatura antropológica existente sobre sociedades caçadoras coletoras, questões sobre como pessoas interagem, prática e tecnicamente, com os recursos do ambiente natural para obtenção dos meios de subsistência tendem a ser tratados separados das questões de como o seu “mundo vivo” é imaginativamente construído com mitos, religiões e cerimônias. Os meios de subsistência são tipicamente dirigidos em termos naturalistas, muitas vezes através da comparação com o comportamento “forrageiro” de animais não humanos, aproveitando as mesmas estruturas dos conceitos e teorias empregados pelos ecologistas animais. Já os mitos, religiões e cerimônias por contraste, são considerados tópicos adequados para uma análise cultural, devido a sua preocupação com as formas pelas quais o ambiente natural e as relações que as pessoas têm com ele, são representados na consciência.
O autor acredita que essa divisão entre as considerações “naturalísticas” e “culturalógicas” é lamentável, na medida em que pressupõe precisamente a separação entre o “naturalmente real” e o “culturalmente imaginado”. Para Ingold é necessário colocar esse ponto em questão se quisermos chegar ao fundo da própria percepção de mundo das pessoas.
Partindo da premissa que modos de agir no ambiente natural são também modos de percebê-lo, os ensaios sugerem como essa divisão poderá ser superada.
No Capítulo 1, o autor definiu um cenário comparando as explicações que os biólogos ocidentais e os caçadores indígenas dão ao comportamento do caribu durante os episódios de predação. Ele mostra que a autoridade científica da primeira explicação, bem como a compreensão antropológica da última, encaixam-se dentro de uma cosmologia (origem de um universo) culturalmente específica, que depende de um “desengajamento” feito em duas etapas que primeiro elimina a natureza, depois a cultura, como objetos de atenção. 
Bibliografia:

INGOLD, T.. The perception of the environment : essays in livelihood, dwelling and skill, London, Routledge, 2000.

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