quinta-feira, 10 de novembro de 2011
quarta-feira, 2 de novembro de 2011
Mestres Canoeiros
Em “A construção material e simbólica da canoa caiçara em Ilhabela”, de Wanda Maldonado, encontramos na página 316, a descrição dos conhecimentos práticos necessários para o mestre canoeiro transferir ou reproduzir material e simbolicamente a canoa dentro de um grupo social:
“Com relação à construção da canoa em Ilhabela observamos uma distinção entre o pescador que faz as canoas e o mestre-canoeiro. O primeiro pode até ter boa parte dos conhecimentos necessários à construção de uma canoa e obter um produto de qualidade razoável, ou seja, uma canoa pequena que servirá à pesca costeira. Mas ele não tem o reconhecimento social, não possui o status que caracteriza o especialista. O mestre-canoeiro, por sua vez, possui o conhecimento, as habilidades e, talvez a mais importante distinção, a experiência.
...O mestre é o que conhece e domina o processo de construção da canoa por inteiro e coordena o trabalho dos ajudantes, seus aprendizes. O resultado do trabalho do mestre-canoeiro é uma canoa perfeita e a canoa perfeita é a que possui, além das qualidades necessárias à navegabilidade, uma estética reconhecida pelos pescadores.”
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Pintor Gomide
“Depois da pesca”, Antonio Gomide, Ubatuba, década de 60. http://www.dangaleria.com.br/exposicao/expogomide/pinturas.html. Acesso em 28 maio 2011.
Muito provavelmente a Praia da Enseada em Ubatuba sp
Pau de Canoa
Em “Concurso literário Ubatuba 2008 - Antologia, poesia, conto, teatro” editado pela Fundart, no conto “Pau de canoa” de Edgard O. C. Prochaska, página 60, percebemos a importância simbólica da canoa dentro do universo mítico do caiçara:
“Mais abaixo um pouco, para os lados do riacho que escorria rumo ao
grotão, a claridade desenhou aos olhos de Fabiano a visão de uma grande canoa
que flutuava silenciosa por entre a bruma da manhã. Fabiano ficou meio aturdido
com aquela aparição, mas era homem de coragem e não dado a espantar-se com coisa
pouca. Atirou de lado a capa pra acordar de vez, esfregou os olhos e apanhou do
chão o picuá onde, decerto ainda haveria um resto de farofa e um golpinho de café
na garrafa arrolhada.
Religioso à sua maneira de ser, sentiu ter recebido um sinal mandado de Deus. Era um pau de canoa perfeito, reto e sem falhas, casualmente poupado pelo machado ou pelo fogo, pelas avalanches ocasionais ou pelos relâmpagos das tempestades que, às vezes, varriam a serra do mar.
...Fabiano respeitava a natureza como se respeita a uma mãe, decerto pelo próprio caráter dele ou por sentimento de proteção às coisas vivas que nos cercam. Sabia que para fazer a canoa, teria de matar a árvore e outro jequitibá igual aquele dificilmente iria aparecer nas próxima gerações. Então ajoelhou-se ao pé do tronco e fez uma reza pedindo perdão ao espírito da floresta e ao jequitibá, pelo que sabia ser necessário fazer. Em seguida ajeitou o facão e gravou com a ponta do metal suas iniciais em três locais diferentes, marcando o tronco e reservando-o como sua propriedade para pau de canoa. Ao terminar a última marca, uma grande gota de resina escapou do talho e tomou a forma de lágrima, enquanto que uma lágrima também escorreu do olho de Fabiano. Dizem mesmo os antigos que conheciam o fato que, naquele momento, criou-se um elo mágico e por isso mesmo aquela canoa seria encantada.”
foto: Peter Santos Németh
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